Jean Paul Prates assume o comando interino da Petrobras já sob pressão da União, acionista controladora, por uma mudança nos rumos da política de preços de combustíveis, mas uma alteração significativa no curto prazo não é esperada por especialistas do mercado.
Além de limitações previstas em estatuto para que a Petrobras contribua com políticas públicas, uma ruptura brusca na trajetória de preços de diesel e gasolina atualmente poderia desequilibrar o mercado e causar riscos de desabastecimento, uma vez que o país é muito dependente das importações desses produtos.
“Com a mudança para o novo CEO, a gente não vê um impacto relevante de preços no curto prazo, não só pelas questões estatutárias. Ele mesmo [Prates] já deixou claro que não vai deixar que a política de preços não siga um comportamento internacional”, disse o sócio-diretor da Raion Consultoria, Eduardo Oliveira de Melo.
As ações da Petrobras estiveram entre as maiores quedas da Bolsa nesta quinta, na direção oposta do preço do petróleo, que operou em alta. Os papéis ordinários da empresa (PETR3) caíam 2,79%, a R$ 29,57. Já as ações preferenciais (PETR4) recuaram 2,74%, a R$ 26,20.
Leandro De Checchi, analista de Investimentos da Clear, diz que o mercado parece não ter gostado do já esperado anúncio de Jean Paul Prates como novo CEO. “Os investidores devem seguir atentos às diretrizes estratégicas da atual gestão”, diz.
A Petrobras elevou na véspera o valor da gasolina nas refinarias em 7,5%, mas analistas ainda veem espaço para novos reajustes.
Os preços do diesel da Petrobras considerando a média nos principais polos de venda às distribuidoras no fechamento de quarta-feira está 2% abaixo da paridade de importação, enquanto a gasolina está 4% abaixo, segundo cálculos da Abicom (Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis).
Mas a pressão do governo federal vem também em momento em que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, tem estudado meios para voltar a cobrar tributos federais sobre diesel e gasolina —este último previsto para ser retomado no fim deste mês— sem onerar o bolso dos consumidores.
Em declarações recentes, Haddad tem dito que aguarda a posse do novo CEO para encontrar uma solução junto à estatal.
Prates, por sua vez, tem defendido o fim da aplicação da paridade de importação para a formação dos preços da petroleira, mas diz que a empresa ainda assim seguirá indicadores internacionais.
Historicamente a Petrobras, que tem ações negociadas em Bolsa, tem de lidar com tentativas de interferências políticas em suas estratégias e, desde 2016, conseguiu certa autonomia para adotar uma política de preços que segue indicadores internacionais, contribuindo com resultados financeiros positivos e uma abertura do mercado para outros investidores.
Grandes distribuidoras de combustíveis como Vibra, Raízen e Ipiranga investiram alto em infraestrutura de importação nos últimos anos, e hoje buscam parte de seu suprimento no exterior, tirando da Petrobras a responsabilidade de ser a única a abastecer o mercado.
A Petrobras também realizou a privatização da refinaria Rlam, na Bahia, que representa 14% da capacidade total de processamento de petróleo do país, em outro movimento que reduziu sua relevância no suprimento nacional.
A unidade, rebatizada de Mataripe, pertence hoje à Acelen, do grupo Mubadala Capital, que tem uma política de preços de combustíveis com atualizações mais frequentes do que a Petrobras.
Mas isso tudo não aconteceu sem percalços. Toda vez que os preços internacionais disparam, a petroleira tem sido atacada por segmentos políticos e da sociedade, como responsável por prejudicar a inflação. O PT defende que a petroleira contribua com uma estabilidade maior de preços.
Após grandes prejuízos por subsidiar preços de combustíveis a mando do governo no passado, o estatuto da Petrobras passou nos últimos anos a prever condições para que a companhia possa ter suas atividades orientadas pela União.
Dentre as exigências, o estatuto prevê que a companhia deverá ser compensada pelo governo, quando for chamada a realizar atividades de modo a contribuir para o interesse público.
“O desafio que ele [Prates] enfrenta é tentar conciliar uma visão de uma Petrobras moderna, gerando retorno para acionistas, com uma visão mais intervencionista do novo governo”, disse Paulo Valois, sócio do Schmidt Valois Advogados.
Valois pontuou que o governo precisa encontrar uma solução para evitar volatilidades de preços para consumidores por meio de política governamental.
“Essa situação passa pela Petrobras, mas é muito mais governamental do que simplesmente usar a Petrobras. O governo que tem que agir, o Congresso. Isso é política governamental. Ela [a Petrobras] não pode simplesmente chegar e limitar preço. Tem responsabilidades, governança, acionistas, Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), tem todo um mecanismo de governança que não permite.”
O diretor do CBIE (Centro Brasileiro de Infraestrutura) Adriano Pires também se posicionou contra uma possível intervenção estatal na Petrobras, defendendo que 2022 talvez tenha sido o melhor ano da história da companhia.
“Pagou impostos, royalties e participações especiais recordes. Além dos dividendos recordes para os seus acionistas. Bateu metas de produção ficando acima do centro da meta… Esses resultados mostram que a política de dar uma maior autonomia para a administração da empresa, sem um intervencionismo direto do governo, é o melhor caminho”, afirmou.
Para Pires, a indicação de Prates é boa, pois ele conhece o setor de óleo e gás e tem ainda um bom trânsito no Congresso. “Não dá para falar agora. Vamos esperar ele chegar. Mas eu acho que ele reúne todas as condições de fazer uma boa gestão”, concluiu. (Reuters)