IBP e distribuidoras tentam reduzir ou postergar metas do RenovaBio em 2020

A Brasilcom, que representa distribuidoras regionais de combustíveis conseguiu esta semana uma redução liminar na Justiça Federal para reduzir em 25% as metas do Renovabio para 2020.

O movimento ocorre poucos dias após o IBP, que representa grandes distribuidoras e produtores de petróleo, se manifestar em defesa do corte dessas metas quando o programa não tiver uma oferta de créditos suficiente para “caracterizar um mecanismo de mercado”.

O IBP também defende a flexibilização da postergação de até 15% das metas individuais anuais.

Distribuidoras são obrigadas a comprar créditos carbono (CBIOs) na proporção de sua participação do mercado de combustíveis fósseis. Esse rateio é feito a partir da definição de metas anuais pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), que diante da crise provocada pela pandemia de covid-19, cortou em 50% a aquisição compulsória para este ano.

Mesmo com a revisão, as associações entendem que a oferta de CBIOs, emitidos por produtores de biocombustíveis, não será suficiente, seja para garantir que haja competição nesse mercado brasileiro de carbono, como afirma o IBP, ou porque a escassez está distorcendo o mercado, elevando o preço do crédito e o peso do programa na conta das distribuidoras, como afirma a Brasilcom.

A Ubrabio, maior representante do setor de biodiesel, em volume de produção, afirmou que essa tentativa de cortas as metas na Justiça é “inadmissível”, tendo em vista que o programa acabou de ser revisado, em setembro, “após um amplo processo de consulta pública promovido pelo Ministério de Minas e Energia (MME) com a participação de todos os atores interessados, inclusive as distribuidoras”.

“A liminar obtida pela Brasilcom para que suas 46 associadas cumpram apenas 25% das metas atuais de compras de créditos de descarbonização (CBIOs) do RenovaBio em 2020 cria uma instabilidade desnecessária no mercado e ameaça a credibilidade da política de descabonização dos combustíveis do país – que tem servido de modelo para outros países”, afirmou a Ubrabio, nesta terça (10).

De acordo com a Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio) a decisão de redução das metas  em 25% é “retrógrada do ponto de vista ambiental” e  compromete a confiança no Renovabio.

“A Aprobio está acompanhando o desenrolar do processo e entende que o pedido de reconsideração da ANP é consistente”, afirmou a entidade à epbr.

Redução de 25% na meta

A meta deste ano é de 14,5 milhões. Se a decisão judicial for mantida, a meta global do ano cai para 10,9 milhões, menos do que o volume em estoque na B3, de cerca de 13 milhões.

“Fato é que as distribuidoras estão sendo compelidas a cumprir a meta anual em apenas três meses, sem que haja CBIO suficiente no mercado, o que gerou uma supervalorização desse ativo”, afirma a Brasilcom no processo.

Leva em consideração que apenas em 25 de setembro, após a revisão – e o corte de 50% para 14,5 milhões – as metas individuais foram oficializadas pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

De acordo com dados da B3, desta terça (10), há 13,295 milhões CBIOs em estoque, sendo 5,853 milhões emitidos pelos produtores. As distribuidoras, chamadas de partes obrigadas, adquiriram 7,408 milhões de créditos e outros agentes, 33 mil.

Tanto a proposta do Ministério de Minas e Energia (MME), como os produtores de biocombustíveis e as maiores distribuidoras do país, BR Distribuidora e Raízen, concordaram que haverá CBIOs suficientes este ano, durante a consulta para revisão da meta.

Em geral, os produtores e a Raízen defenderam uma redução menor e a BR Distribuidora, um corte maior para 8,5 milhões, por entender que haverá escassez no futuro.

A Brasilcom, na época, defendeu a redução da meta para 7,5 milhões de créditos e “que as metas futuras sejam reanalisadas à luz da realidade deste novo mercado, incluindo as diferenças regionais”, disse a associação.

Problema mesmo é o preço

“A distorção entre a oferta (já que os CBIOs são disponibilizados no mercado por agentes não obrigados) e a procura por CBIOs (tanto por parte das distribuidoras, agentes obrigados, quanto por agentes não obrigados), vem acarretando uma substancial elevação do preço”, afirma a Brasilcom no pedido feito à Justiça. A associação é representada pelo Demarest Advogados

O argumento está em linha com a manifestação do IBP, publicada na sexta (6).

“A diferença entre o volume de CBIOs escriturados pelos emissores e os disponíveis para comercialização indica um represamento na oferta e tem contribuído para a escalada de preço do Certificado, tendo atingido R$ 68 em 28 de outubro, contra cerca de R$20, um mês antes”, afirma o instituto.

Nas operações mais recentes, a venda dos CBIOs voltou a ser fechada ao preço médio de R$ 50.

O IBP representa as grandes petroleira em operação no país e, em junho, criou a Associação Brasileira de Downstream, com 15 associada, entre elas, Petrobras, BR Distribuidora, Ipiranga e Raízen.

Conclui que nova revisão é necessária, para criar mecanismos que garantam que o Renovabio, de fato, configure a criação de um mercado de carbono, com a possibilidade de mudança nas metas sempre que for necessário garantir que a oferta de CBIOs seja maior do que a demanda das distribuidoras.

“Esse desequilíbrio põe em risco a sustentabilidade do RenovaBio, pode gerar aumento de custos na cadeia da gasolina e óleo diesel, problemas no fluxo de caixa de distribuidoras e a própria organização desse mercado”, afirma a associação.

O IBP defende que:

  • O governo deve autorizar a flexibilização de até 15% da meta individual deste ano para 2021. “A simples aplicação deste disposto legal já garantiria um melhor equilíbrio entre oferta e demanda de CBIOs”
  • Os produtores devem ser obrigados a disponibilizar os CBIOs para comercialização na B3, em um prazo a partir da emissão. “Para o mercado funcionar, não é suficiente ter CBIOs escriturados pelo emissor, é necessário que esses títulos estejam disponíveis para comercialização”, diz a associação;
  • O CNPE deve, se necessário, reduzir as metas sempre que a disponibilização de volumes de CBIOs não for superior à meta dos distribuidores, “de forma a caracterizar um mecanismo de mercado”.

A postergação de 15% da obrigação para o ano seguinte está prevista na legislação do programa, mas não vale para este ano, já que o benefício é destinado para distribuidoras que atenderam a meta no ano anterior – em 2019, não houve comercialização de CBIOs. ANP de manifestou sobre isso recentemente.

Em geral, as mudanças defendidas pelo IBP podem, na prática, ocorrer por meio da redução de metas, a partir de uma decisão do CNPE.

Na íntegra, a manifestação do IBP

O Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP) e suas associadas, atentos aos desafios impostos pelas mudanças climáticas e à necessidade de redução de emissões de gases de efeito estufa, apoiam a Política Nacional de Biocombustíveis (Renovabio) e a expansão dos biocombustíveis na matriz energética brasileira, que valorizam a diversidade de fontes energéticas no Brasil.  

No entanto, para garantir a efetividade dessa política, é preciso que sejam disponibilizados para comercialização os Créditos de Descarbonização, os chamados CBios, em quantidade suficiente para o  cumprimento das metas impostas às distribuidoras de combustível.

A aquisição de CBio é uma ferramenta utilizada pelo RenovaBio para atingir parte das metas de redução de emissões de gases de efeito estufa assumidas pelo Brasil no Acordo de Paris. Cada CBio equivale a uma tonelada de dióxido de carbono (CO2) não emitida.

Neste sentido, é importante discutir os desafios que o setor de distribuição tem vivenciado no primeiro ano de implantação de metas compulsórias de compra de CBios. Existe ainda um descompasso entre as metas obrigatórias de compra pelas distribuidoras de combustíveis, de 14,5 milhões de CBios em 2020, e o reduzido volume de títulos efetivamente disponíveis para comercialização na B3, até o momento. Aqui vale esclarecer que CBIOs podem ser escriturados pelo emissor sem estarem disponíveis para aquisição na B3.

Esse desequilíbrio põe em risco a sustentabilidade do RenovaBio, pode gerar aumento de custos na cadeia da gasolina e óleo diesel, problemas no fluxo de caixa de distribuidoras e a própria organização desse mercado.

Os certificados começaram a ser emitidos/depositados na B3, por meio do mercado de balcão, em 27 de abril deste ano. Em 5 de novembro, segundo dados da própria B3, o total de CBios escriturados pelos emissores correspondia a 13,0 milhões de títulos, cerca de 10% abaixo da meta prevista para este ano, tendo sido adquiridos pela parte obrigada do Renovabio, os distribuidores de combustíveis, 7,2 milhões.

A diferença entre o volume de CBios escriturados pelos emissores e os disponíveis para comercialização indica um represamento na oferta e tem contribuído para a escalada de preço do Certificado, tendo atingido R$ 68 em 28 de outubro, contra cerca de R$20, um mês antes. Essa valorização pode impactar o valor do combustível para o consumidor final e o fluxo de caixa das empresas do setor, dado o prazo curto para cumprimento das metas obrigatórias até o fim deste exercício.

O IBP entende que alguns ajustes são necessários para que este novo mercado funcione adequadamente.  O principal é a no disposto na Lei 13.576 de 2017, regulamentado pelo Decreto 9.888/2019 que trata da flexibilização do cumprimento de 15% da meta estipulada em um ano para o ano seguinte.  A simples aplicação deste disposto legal já garantiria um melhor equilíbrio entre oferta e demanda de CBIOs.

Adicionalmente, o IBP defende que o programa estude a implantação de outros mecanismos que possam conferir maior controle e transparência ao processo de comercialização desses certificados, como:

  • Avaliação de prazo máximo para o produtor disponibilizar os CBios para comercialização na B3, a partir da data de sua emissão. Para o mercado funcionar, não é suficiente ter CBios escriturados pelo emissor, é necessário que esses títulos estejam disponíveis para comercialização; 
  •  A disponibilização de volumes de CBios em volume superior à meta dos distribuidores, de forma a caracterizar um mecanismo de mercado. E caso esta oferta não se verifique, a revisão das metas nacionais dos distribuidores para um patamar correspondente a este valor.

Reafirmando seu apoio ao Renovabio e à utilização dos biocombustíveis, o IBP defende uma reflexão urgente sobre a mecânica do mercado de CBios e a flexibilização de suas metas neste ano de estreia, o que trará equilíbrio e previsibilidade para o setor, e ganhos para a sociedade. Temos confiança de que, com os ajustes necessários, os CBios se consolidarão como um instrumento de mercado, importante para a transição energética brasileira e como indutor do desenvolvimento de biocombustíveis.

Na íntegra, a manifestação da Ubrabio

A liminar obtida pela Brasilcom para que suas 46 associadas cumpram apenas 25% das metas atuais de compras de créditos de descarbonização (CBIOs) do
RenovaBio em 2020 cria uma instabilidade desnecessária no mercado e ameaça a credibilidade da política de descabonização dos combustíveis do país – que tem servido de modelo para outros países. O alerta é da União Brasileira do Biodiesel e Bioquersene (Ubrabio).

Para a entidade, essa revisão de metas via judicialização é inadmissível, uma vez que, em setembro, após um amplo processo de consulta pública promovido pelo Ministério de Minas e Energia (MME) com a participação de todos os atores interessados, inclusive as distribuidoras, a quantidade de CBIOs que as distribuidoras deveriam adquirir foi reduzida quase pela metade – de 28,7 milhões passou para 14,5 milhões.

A Ubrabio destaca ainda que a ação não se justifica, uma vez que a quantidade de créditos disponibilizados pelos produtores de combustíveis é suficiente para atendimento das metas, indo de encontro ao argumento apresentado pelas distribuidoras no processo contra o cumprimento
das metas já reduzidas.

Segundo informações da B3, até ontem (09), foram colocados à venda 13,2 milhões de CBIOs – volume próximo à meta. Além disso, ainda existem créditos escriturados para serem disponibilizados na bolsa.

Por fim, a Ubrabio ressalta que o RenovaBio é uma política de Estado desenhada para que o Brasil possa cumprir seus compromissos ambientais assumidos em tratados internacionais, como o Acordo de Paris. A judicialização do programa cria insegurança no mercado, ao dar sinais confusos em relação ao cumprimento da política, e é um desserviço para a sociedade brasileira, que deixa de captar as externalidades socioeconômicas e ambientais dos biocombustíveis.

A Ubrabio está analisando juridicamente como intervir nesta esdrúxula decisão decorrente de um pedido que não atende os interesses da sociedade e, no nosso entendimento, não tem amparo legal.

 

Fonte: https://epbr.com.br/ibp-e-distribuidoras-tentam-reduzir-ou-postergar-metas-do-renovabio-em-2020/?amp=1

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