MANAUS – Ao defender a venda da Reman (Refinaria de Manaus Isaac Sabbá), em manifestação enviada ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) na última quarta-feira (30), o Grupo Atem e a Petrobras acusaram a Raízen, a Ipiranga, a Equador e a Fogás de usar informações falsas para manchar a reputação da Atem e induzir o Cade a erro, e pediram investigação.
“As terceiras interessadas se baseiam em informações sabidamente falsas e enganosas na tentativa de manchar a reputação da Atem Distribuidora e induzir a SG em erro quanto às razões que levaram ao seu crescimento no mercado de distribuição e o contexto em que isso se deu”, diz trecho do documento assinado por advogados do Grupo Atem e Petrobras.
Para a Petrobras e o Grupo Atem, o “verdadeiro risco concorrencial” que preocupa as concorrentes é o “risco de mais concorrência (não menos)” nos mercados de refino e de distribuição de combustíveis no país. Os advogados afirmam que a posição das distribuidoras no Cade é mais como concorrentes da Atem do que como clientes da Reman.
Anunciada em agosto de 2021, a venda da refinaria e seus ativos logísticos associados pelo valor de US$ 189,5 milhões (equivalente a R$ 994,15 milhões) ao Grupo Atem estava prevista para ser finalizada em março deste ano, conforme informou a compradora em outubro passado, mas a resistência das concorrentes adiou a concretização da operação.
Após o anúncio da venda da refinaria ao Grupo Atem, a Raízen (detentora da marca Shell no Brasil), a Ipiranga, a Equador e a Fogás recorreram ao Cade para anular a operação, sob alegação de receio de práticas discriminatórias e preços abusivos contra elas. Elas citaram a possibilidade de a Atem restringir o acesso das concorrentes a insumos essenciais.
No dia 8 de março, o Cade declarou a transação complexa e solicitou mais informações da Petrobras e do Grupo Atem para avaliar se a venda da Reman pode afetar o suprimento da demanda das distribuidoras de combustíveis que operam na região. A autarquia também vai examinar se há outras alternativas às concorrentes do Grupo Atem.
Na quarta-feira (30), os advogados da Petrobras e do Grupo Atem enviaram manifestação contestando, com duras críticas às concorrentes, todas as questões levantadas no Cade. Para a estatal e o grupo empresarial, as empresas estão incomodadas com a “expansão legítima de rival com trajetória de concorrência vigorosa e meritória”.
“A verdadeira preocupação das distribuidoras é com as sinergias e ganhos de eficiência e competitividade resultantes da Operação, que permitiriam ao Grupo Atem ampliar a concorrência vigorosa que já vem oferecendo ao mercado, desafiando ainda mais o domínio do oligopólio tradicional da Raízen, da Ipiranga e da Vibra na distribuição de combustíveis”, disseram os advogados.
A Petrobras e o Grupo Atem pediram multa de até R$ 5 milhões às concorrentes da Atem em razão da apresentação de possíveis informações inverídicas e omissão deliberada de fatos relevantes. Elas sustentam que a punição servirá para “dissuadir esse comportamento vergonhoso de má-fé processual e desrespeito à dignidade do Cade”.
Dependência
Sobre a possível dependência das distribuidoras à Reman, a Petrobras e o Grupo Atem afirmaram que a produção da refinaria de Manaus é insuficiente para abastecer a Região Norte. Segundo elas, a região é abastecida em mais de 80% pela produção de refinarias de outras regiões do país ou estrangeiras, que chegam na capital amazonense via cabotagem.
“Esse enorme volume de fontes externas comprova a existência de opções viáveis de abastecimento de combustíveis líquidos, tanto na perspectiva logística como econômica, para além da própria Reman. Trata-se de volumes que não estão inseridos no escopo da operação e que, mais do que nunca, competirão concretamente com a produção da Reman”, disseram os advogados.
Em relação ao GLP produzido pela Reman, a estatal e o grupo empresarial afirmaram que o Grupo Atem “não tem atuação no mercado de distribuição de GLP” e que, “na ótica concorrencial, a operação não afeta minimamente as condições estruturais ou de rivalidade atualmente existentes nesse setor”.
No Amazonas, a venda no varejo de GLP (gás de cozinha) é dominado pela Fogás, que tem apenas uma concorrente, a Amazongás.
A Petrobras e o Grupo Atem também rebateram a alegação de que as distribuidoras da região necessitam do TUP (Terminal de Uso Privado) da Reman. Segundo os advogados, o terminal “não é nem nunca foi infraestrutura de movimentação e armazenamento utilizado pelas distribuidoras da região” e foi construído e utilizado exclusivamente pela Petrobras.
Ainda de acordo com os advogados, caso as distribuidoras dependessem do acesso a infraestrutura de terminal em Manaus para receber navios de grande porte, “o tempo e os investimentos necessários para a construção de um TUP para importação não são proibitivos”. Eles citam que, recentemente, o Grupo Atem construiu um terminal em Manaus.
“Mais importante que isso, os TUPs de propriedade das próprias distribuidoras em Manaus/AM (píeres e flutuantes) já existem e já são utilizados para o recebimento e escoamento de produtos (via cabotagem) em suas bases de distribuição nessa localidade”, afirmaram a Petrobras e o Grupo Atem.
Ao chamar de “oportunista e ilegítimo” o pedido da Fogás para acessar o terminal da Reman, a Petrobras e o Grupo Atem afirmaram que as estruturas da Reman “são essenciais para o funcionamento da própria atividade de refino e, portanto, não haveria como se transferir ou conceder livre acesso aos ativos” sem comprometimento do funcionamento das operações.
Domínio
O Grupo Atem negou que tem posição dominante no mercado de distribuição de combustíveis na Região Norte – segundo ele, a sua participação não supera 20% – e alegou que sofre “concorrência vigorosa de grandes grupos econômicos nacionais integrados verticalmente, como Raízen, Ipiranga e Vibra”.
Sobre a alegação de “práticas de fechamento de mercado”, os advogados afirmaram que é “improvável” porque outros ofertantes, incluindo a própria Petrobras, têm condições de “rivalizar de forma efetiva e vigorosa com a Reman” no suprimento das distribuidoras de combustíveis concorrentes da Atem, por meio de cabotagem ou importação.
“É evidenciado pelo fato de já existir hoje volume significativo de combustível refinado fora da região Norte (mais de 80%) trazido para complementar a produção absolutamente deficitária da Reman em relação à demanda da região”, diz o documento. Para os advogados, a caracterização da Reman como “monopólio regional” não passa de “falácia”.
Além disso, segundo a estatal e o grupo empresarial, “não faria qualquer sentido econômico a paralização das atividades da Reman ou a discriminação de concorrentes diante da necessidade de otimização da produção da Reman para recuperar os massivos investimentos em curso”.
Eles também afirmaram que o Grupo Atem não tem condições de absorver toda a produção da Reman, e que o objetivo principal dele, ao assumir futuramente a operação da Reman, é “maximizar a margem de refino da Reman e aumentar seus níveis de produção, dependendo da manutenção dos clientes da refinaria para a viabilidade da operação de refino”.
Investigação
Ao pedir a aprovação da operação de venda da Reman, a estatal e o grupo empresarial pediram que as empresas Ipiranga, Raízen e Equador sejam investigadas e punidas “exemplarmente” por conta da apresentação de informação “sabidamente inverídicas e omissão deliberada de fatos relevantes à instrução da Operação”.
A reportagem solicitou informações às empresas Raízen, Equador, Ipiranga e Fogás, mas até a publicação desta matéria nenhuma resposta foi enviada.