Decisão do ministro vinculou eficácia dos acordos de redução de jornada e de salário ou de suspensão temporária de contrato de trabalho a consentimento dos sindicatos.
“A decisão não acarretou qualquer insegurança jurídica.” Foi o que disse o ministro Lewandowski ao rejeitar embargos da AGU opostos contra a liminar proferida por S.Exa. na ADIn 6.363, que questiona pontos da MP 936/20.
A polêmica se instalou quando, na semana passada, por meio de liminar, o ministro entendeu que a interpretação do texto da MP, conforme a CF/88, seria “no sentido de que os ‘acordos individuais’ somente se convalidarão, ou seja, apenas surtirão efeitos jurídicos plenos, após a manifestação dos sindicatos dos empregados”.
No decisum, o ministro observa que a própria MP fazia referência à comunicação ao sindicato, acerca do acordo. E que tal informação não seria inócua, até mesmo pelo papel de relevância que o constituinte deu aos sindicatos. Isso sem falar que “seria impensável conceber que o Presidente da República – considerado o elevado discernimento que o exercício do cargo pressupõe – pretendesse, com a Medida Provisória, que os sindicatos, ao receberem a comunicação dos acordos individuais, simplesmente os arquivassem”.
Muitos advogados, todavia, viram nessa condição sine qua non um empecilho para que fossem firmados acordos. A própria AGU, em defesa do texto presidencial, impetrou embargos de declaração.
E, em reposta à AGU, o ministro fez um bem apanhado arrazoado sobre as dúvidas da comunidade jurídica. Para o ministro,
“Contratempos que possam eventualmente advir da participação dos sindicatos nas negociações não têm o condão de sensibilizar o intérprete do Texto Constitucional, voltado, por dever de ofício, a preservar os valores superiores de convivência social nele abrigados. Não é demais insistir que a própria Medida Provisória aqui contestada é que instituiu a obrigação de comunicar os acordos individuais ao sindicato. E dessa comunicação – que não pode ser tida como simples figura retórica – há de extrair-se algum efeito!”
Para Lewandowski, eventuais dificuldades em identificar ou contatar os sindicatos para comunicá-los não justifica o descumprimento da expressa determinação da MP.
“Cabe ao empregador adotar todas as providências ao seu alcance para localizar o sindicato, a federação ou a confederação apta a receber a comunicação. E aqui, vale sublinhar que uma das possíveis consequências jurídicas da falta de comunicação do empregador à respectiva entidade sindical, no prazo de 10 dias, estabelecido pela MP, será a perda da validade do acordo individual por descumprimento de formalidade essencial.”
Ministro ainda anotou que o esvaziamento do poder dos sindicatos, ensejado por modificações legislativas recentes, “não pode levar a um enfraquecimento ainda maior dessas agremiações. Não há, ao menos sob a égide da ordem legal vigente, nenhuma possibilidade de excluí-las das negociações trabalhistas”.
Assim, asseverou, a medida cautelar embargada “não acarretou qualquer insegurança jurídica”.
“Pelo contrário, buscou emprestar confiabilidade aos acordos individuais, sobretudo porque apenas fez valer o disposto na Constituição quanto ao modo de emprestar validade às pretendidas reduções de salários e jornadas de trabalho.”
O ministro ainda acrescentou que:
“Embora se compreenda a insistência governamental e de certos setores econômicos em acelerar os acordos individuais, superestimando supostas consequências deletérias decorrentes da liminar concedida, em especial o ‘engessamento’ das negociações, o fato é que constituiria precedente perigosíssimo afastar a vigência de normas constitucionais asseguradoras de direitos e garantias fundamentais, diante do momento de calamidade pública pelo qual passamos.”
E que isso só seria possível, “e mesmo assim em escala limitada e sob supervisão do Congresso Nacional – durante a decretação dos Estados de Defesa ou de Sítio, escrupulosamente delimitados nos art. 136 e 137 da Lei Maior”.
O ministro observa ainda que é justamente nos momentos de adversidade que se deve conferir a máxima efetividade às normas constitucionais, sob pena de graves e, não raro, irrecuperáveis retrocessos.
“De forma tristemente recorrente, a história da humanidade tem revelado que, precisamente nessas ocasiões, surge a tentação de suprimir – antes mesmo de quaisquer outras providências – direitos arduamente conquistados ao longo de lutas multisseculares. Primeiro, direitos coletivos, depois sociais e, por fim, individuais. Na sequência, mergulhase no caos!”
Como se pode ver, o ministro praticamente antecipa os substanciosos argumentos que irá proferir no próximo dia 16, quinta-feira, na sessão plenária do STF.
Com efeito, a convalidação ou não da liminar está pautada para ser analisada neste dia, no “encontro” virtual dos ministros, por meio de videoconferência.
Fonte: Migalhas, 14.04.2020